segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Os direitos humanos são para homens direitos.

Carta enviada de uma mãe para outra mãe em SP, após noticiário na TV.
De mãe para mãe.

Vi seu enérgico protesto diante das câmeras de televisão contra a transferência do seu filho, menor infrator, das dependências da FEBEM em São Paulo para outra dependência da FEBEM no interior do Estado.
Vi você se queixando da distância que agora a separa do seu filho, das dificuldades e das despesas que passou a ter para visitá-lo, bem como de outros inconvenientes decorrentes daquela transferência.
Vi também toda a cobertura que a mídia deu para o fato, assim como vi que não só você, mas igualmente outras mães na mesma situação que você, contam com o apoio de Comissões Pastorais, Órgãos de Entidades de Defesa de Direitos Humanos, ONGs, etc.....
Eu também sou mãe e, bem posso compreender o seu protesto. Quero com ele fazer coro. Enorme é a distância que me separa do meu filho. Trabalhando e ganhando pouco, idênticas são as dificuldades e as despesas que tenho para visitá-lo. Com muito sacrifício, só posso fazê-lo aos domingos porque labuto, inclusive aos sábados, para auxiliar no sustento e educação do resto da família. Felizmente conto com o meu inseparável companheiro, que desempenha, para mim, importante papel de amigo e conselheiro espiritual. Olhe você ainda não sabe, sou a mãe daquele jovem que o seu filho matou estupidamente num assalto a uma vídeo locadora, onde ele, meu filho, trabalhava durante o dia para pagar os estudos á noite.
No próximo domingo, quando você estiver abraçando, beijando e fazendo carícias no seu filho, eu estarei visitando o meu e depositando flores no seu humilde túmulo, num cemitério da periferia de São Paulo.....
No cemitério, nem na minha casa, NUNCA apareceu nenhum representante destas "Entidades" que tanto lhe confortam, para me dar uma palavra de conforto e talvez me indicar "Os meus direitos"!
Com amor, de uma mãe sofrida e sem filho á outra mãe sofrida.
Ah! Ia me esquecendo: mesmo ganhando pouco e sustentando a casa, pode ficar tranquila, viu? Que eu estarei pagando de novo, o colchão que seu querido filho queimou lá na última rebelião da FEBEM e que motivou a transferência dele para outra unidade no interior
Circule este manifesto!
Talvez a gente consiga acabar com esta inversão de valores que assola o Brasil!
Direitos humanos são para homens direitos.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

História do Pranto Um Testemunho

Numa idade em que as crianças ficam desesperadas para falar, ele pode passar horas só ouvindo. Tem quatro anos, ou foi o que lhe disseram.
Em face do espanto de seus avós e de sua mãe, reunidos na sala de estar da rua Ortega y Gasset, o apartamento de três cômodos do qual seu pai, que ele se lembre, sem nenhuma explicação, desaparece uns oito meses antes levando consigo seu cheiro de tabaco, seu relógio de bolso e sua coleção de camisas com o monograma da camisaria Castrillón, e ao qual agora volta quase todos os sábados de manhã, sem dúvida não com a pontualidade que sua mãe desejaria, para apertar o botão do interfone e pedir, não importa quem o atenda, com aquele tom crispado que mais tarde aprende a reconhecer como o emblema do estado em que fica sua relação com as mulheres depois de ter filhos com elas, que desça de uma vez!, ele cruza a sala com toda pressa, vestido com a patética roupa de Super-Homem que acaba de ganhar de presente, e com os braços estendidos para frente, numa tosca simulação do vôo, pato com talas nas asas, múmia ou sonâmbulo, atravessa e estilhaça o vidro da janela francesa que dá para a sacada.


Trecho do livro : A história do pranto de Alan Pauls